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13ª Bienal do MercoSul - Trauma, Sonho e Fuga.


A 13ª Bienal do Mercosul tem na sua proposta uma equação de três conceitos que buscam evidenciar o enigma do indizível. Trauma, sonho e fuga são fenômenos daquilo que não se pode ser dito. Diante da latência de um espirito do tempo que se manifesta no inconsciente, nos deparamos às perguntas cujas respostas não têm uma forma verbal. Esse lugar da poética de um nó na garganta, de um grito não expresso, de um segredo guardado é o que buscamos. 
Túlio Pinto
A poética de Túlio Pinto é marcada pelo uso de materiais industriais como aço, concreto, vidro, borracha e tijolos, com os quais o artista constrói obras que transitam entre a escultura e a instalação, explorando os conceitos de instabilidade e transformação, equilíbrio e tensão. O projeto Batimento, uma instalação em escala urbana, mistura características escultóricas, gráficas e pictóricas. O trabalho é construído a partir de um material industrial e ordinário chamado tela fachadeira, usado para isolar fachadas de prédios em obras ou em processo de restauro, com o qual Pinto confecciona grandes vetores de cor laranja. A tela demarca um percurso suspenso no coração da cidade de Porto Alegre, utilizando as estruturas das edificações como pontos de ancoragem e lançamento. O ritmo e o movimento do desenho urbano criado pela tela oscilam entre diferentes alturas e comprimentos nos seus vários trechos, escoando como um afluente pelo corredor da avenida Borges de Medeiros em direção ao Cais do Porto – um recorte do que poderia ser a representação gráfica da frequência cardíaca da cidade.


´´Os caminhos pela cidade muitas vezes podem nos parecer um fluxo sem volta, o que para alguns pode ser um trauma dia após dia, para outros uma fuga isolada de sua realidade ou até mesmo um sonho tão alto a ser alcançado.``


Adrianna Eu - Garimpo
Refletir sobre quem somos e o que realmente queremos está no centro da instalação de Adrianna eu. 
Um garimpo de si propõe um mergulho subjetivo a partir da experiência de sonhar de olhos abertos: adentrar as vísceras daquilo que somos e nos tornamos ao longo da vida. Garimpar deriva do verbo grimpar, que significa subir por um terreno difícil. Em meio a um emaranhado de linhas, peneiras suspensas balançam em um vai e vem incessante. Escadas pintadas de preto remetem ao escuro dos olhos fechados ou àquilo que velamos por não suportarmos, levando-nos pelos caminhos labirínticos e complexos do inconsciente. Em um país garimpado de tantas formas e a qualquer custo, a artista nos coloca diante de uma reflexão urgente.


´´Mas e ao seu olhar, o sangue que escorre do garimpo nas águas em busca do ouro, você o vê como 
trauma, sonho ou uma forma de fuga?``


José Bento
A falta de oxigênio, que figurou em manchetes aterradoras entre 2020 e 2021, ganha diferentes significados no trabalho de José Bento. Sua instalação é composta por objetos que representam, em tamanho real, cilindros de oxigênio hospitalares. As esculturas de madeira são realizadas por meio da técnica manual de desbaste, lixamento e polimento. O artista cria uma floresta de cilindros, utilizando madeiras variadas que representam os quatro principais biomas brasileiros: o Atlântico, o Amazônico, o Cerrado e a Caatinga. Há também madeiras de outros países, sinalizando que a falta de ar é global e tão ampla quanto a diversidade de leituras da obra Ar.


´´Nosso corpo é um sistema, respiramos automaticamente, tão simples que não vemos que é um sonho. Só quando essa forma deixa de ser automática, e passa a ser mecânica, vemos que esse sonho ficou para trás o tornando um trauma, ou até mesmo uma fuga para poder voltar a sonhar.``


Karola Braga
As conexões entre cheiros, palavras e memória são centrais na pesquisa poética de Karola Braga. O projeto Em suas mãos surpreende o visitante em um espaço inusitado: os banheiros dos espaços expositivos. Saboneteiras confeccionadas em latão são acompanhadas por sabonetes líquidos com diferentes aromas, que variam desde os mais familiares até os mais complexos, convidando o visitante a revisitar ou criar memórias. Já em Lágrimas, terra e crisântemo, um lençol é embebido em cheiro de luto – formado pelos aromas que dão título à obra – e, preso em um varal, libera seu aroma quando movimentado pelo vento. A artista inverte a ideia de assepsia relacionada a um lençol limpo, branco, secando no varal, provocando o visitante com o cheiro que dele se desprende.

´´Faço dos meus sonhos, uma forma de fugir dos meus traumas. 
E assim, sou cada vez mais livre para sonhar e fugir daqueles que tentam fazer da minha existência, um trauma.``

Lucas Dupin
O projeto civilizatório baseado na exploração dos recursos naturais e na consequente desvinculação do ser humano do seu entorno conduz a episódios catastróficos e traumáticos cada vez mais frequentes. Com esse cenário em mente, Lucas Dupin constrói a videoinstalação Da memória vegetal. O artista convida o visitante a circular entre estantes de aço inclinadas, repletas de livros que parecem prestes a cair e cobertas por terra, de onde, aos poucos, vão brotando diferentes espécies de organismos. Plantas de grande porte equilibram as estantes nas quais estão acoplados televisores. No vídeo, imagens de eventos traumáticos recentes se sobrepõem a imagens filmadas dentro de florestas e lugares nos quais a natureza resiste sem a interferência dos seres humanos. O artista questiona: tudo está prestes a cair ou resistiremos apesar da catástrofe em curso?

´´Nos falam que os livros são uma forma de sonhar.
Nos dizem que os livros, são ferramentas de fuga.
Mas e quem nos fala que os livros deixados nas prateleiras, já criaram raízes em forma de traumas da nossa mente.``

Marilá Dardot
A instalação Zero Tolerance Silver Clouds conecta a política estadunidense de imigração “Tolerância Zero” à instalação Silver Clouds (1966), de Andy Warhol. Em 2018, imagens de um centro de detenção no Texas chocaram o público ao mostrar aproximadamente 3 mil crianças presas e separadas de seus pais. Em um espaço gradeado, que Dardot interpreta como uma gaiola, as crianças usavam cobertores prateados feitos com o mesmo material utilizado por Warhol nos balões de sua obra. Evocando um ícone da arte contemporânea, Marilá Dardot confronta os ideais do “sonho americano” com as reais políticas migratórias do país, que impedem os sonhos de muitas pessoas.


 de seus traumas.``


Panmela Castro
O foco da poética de Panmela Castro é o que ela chama de "busca incessante de afeto”. No centro de sua produção estão as relações de alteridade e as questões ligadas ao sentimento de pertencimento. A artista desenvolve obras a partir de diferentes memórias, transitando pelas ruas como uma andarilha em um processo de deriva afetiva, em busca de novos vínculos e conexões com aquilo que a cerca e com a arte. Na Bienal, Castro apresenta uma série de cinco instalações de spray sobre espelho, espalhadas em diferentes espaços (Casa de Cultura Mario Quintana, MARGS e Cais). Mulher pioneira na pichação, prática até então majoritariamente masculina, a artista usa suas vivências para evocar a sensação de transgressão que cada um de nós carrega, com frases escritas na ausência de olhos julgadores. A pichação é deixada para os outros, ao passo que, por estarem escritas em espelhos, quem lê repete as frases para si mesmo.

´´FUGA................................................................................TRAUMA...........................................................................SONHO.``

Sigismond de Vajay & Kevin Lesquenner + LAPSo
A instalação Biocenosis vem sendo desenvolvida por Sigismond de Vajay desde 2013. Para o projeto apresentado na 13ª Bienal do Mercosul, o artista trabalhou em colaboração com Kevin Lesquenner + LAPSo (Laboratório de Acústica e Percepção Sonora da Universidade de Quilmes). Este é o quinto trabalho de uma série de paisagens que tenta despertar a consciência ambiental por meio da arte, fazendo uso dos códigos clássicos da história da arte. A partir dessa obra imersiva e interativa, que representa um modelo de cidade contemporânea inundada, o artista coloca em debate a fragilidade do ambiente urbano em sua fase final de degradação, procurando despertar a consciência sobre a situação ambiental crítica que vivemos hoje.

´´A cidade pode ser um Trauma, Um sonho ou Uma fuga. Mas cuidado! A lei da natureza de pedra é não deixar que o seu sonho se torne um trauma o levando para a fuga de não saber mais sonhar, raios e trovões serão frequentes, mas passageiros.``

Héctor Zamora
A obra de Héctor Zamora nasce como uma resposta direta às características dos prédios que compõem a Casa de Cultura Mario Quintana e que delimitam a Travessa dos Cataventos. A distância que existe entre as duas fachadas cria uma singularidade espacial. As varandas propõem um jogo de aproximação entre os dois lados, lembrando dos varais e das roupas penduradas nas ruas e travessas de pedestres de muitas cidades ao redor do mundo, sobretudo em bairros populares. Esse tipo de varal quebra com as noções de privacidade ao exibir, de maneira involuntária porém consciente, as roupas de quem ali habita, colocando também questões acerca do anonimato de quem pendura sua intimidade. A obra propõe um momento de alegria colorida através do qual faz um comentário político sutil ao opor o momento histórico e levar ao público uma vivência emocional através do jogo da luz, da cor e do vento.

´´O movimento que o vento faz com o que você veste
 Pode parecer um sonho, mas se dói 
É apenas um trauma.
Mas preso, vocÊ quer fugir.
Liberte-se do que lhe prende!``

Mello Landini
A instalação promove a ativação de uma experiência afetiva pela via da conexão indivíduo-meio. A artista convida o visitante a passear por uma sala com uma entrada e uma saída claramente visíveis. O interior, contudo, é entrecortado por uma sequência de “grupos de força”, estruturas conceitualmente construídas por conjuntos de elásticos que se repetem e se somam no espaço, criando uma aparência caótica. À medida que o corpo avança nesse emaranhado, os conjuntos elásticos se deformam e fazem vibrar o espaço, criando novas camadas de experiência. Em contraponto à construção dos elásticos de acordo com uma ordenação quase invisível, o rastro sonoro do corpo pode ser conduzido do estado mais harmônico ao estado cacofônico, mas sempre randômico.

´´Pode parecer um trauma, mas após a fuga, você verá que foi só um sonho.``

C. L. Salvaro
A instalação apresenta uma reflexão sobre a presença ativa do corpo no espaço apesar da limitação física à qual o próprio trabalho nos submete. Ao criar uma espécie de jardim suspenso, pelo qual o visitante passeia tendo contato ora com aquilo que está abaixo ora com aquilo que está acima da terra, Em suspenso propõe um reposicionamento sobre a contemplação da paisagem. O visitante encontra-se imerso em um campo bruto onde é possível perceber a ação do tempo. A estrutura da obra está interligada ao espaço, deixando à mostra a fragilidade de sua composição. Em um instante, tudo parece prestes a desabar, porém, como a respiração presa antes do mergulho, essa apreensão diante do colapso iminente é aliviada pelas aberturas na malha que sustenta a terra, que permitem momentos de respiro.

´´Do seu ponto de vista, do mais alto, ao mais baixo. 
Quem lhe diz o que é o seu sonho, seu trauma e a sua fuga?`` 

Julius von Bismarck
“Irma virá com severidade”, alertava uma manchete de setembro de 2017, pouco antes de o furacão, de categoria cinco, varrer o Caribe e destruir a Flórida. Sua chegada é o tema do filme de Julius von Bismarck, gravado em Nápoles, Flórida, em meio a ventanias e inundações. Em uma tentativa de entender a essência de um furacão para além do espetáculo midiático, as imagens em preto e branco são drasticamente reduzidas, absorvendo chuva e detritos de ruas vazias, carros submersos e casas em desordem. Uma trilha sonora reunida a partir de reportagens é desacelerada para acompanhar o ritmo da imagem em movimento, tornando-se ininteligível. A obra de Bismarck joga com a ambiguidade entre o prazer e a perversidade envolvidos no ato de ver imagens catastróficas ao mesmo tempo em que busca revelar a força devastadora da natureza.
´´Nossas batidas do coração, batem na mesma velocidade quando lembramos dos nossos Traumas, dos nossos Sonhos. Mas quando Fugimos.... as luzes brilham mais forte ainda pois assim estamos caminhando dos traumas aos sonhos.``

AnaVitória | Letícia Monte | Carolyna Aguiar
A videoinstalação DSÍ-embodyment, dirigida por AnaVitória e Letícia Monte, propõe um mergulho nos estados inaugurais do corpo, em uma experiência que perpassa a energia pulsante da vida e da morte. A obra foi criada a partir da proposição A Estruturação do Self de Lygia Clark e do sistema de criação Memória autobiográfica de AnaVitória. O corpo performativo debate-se em uma constante luta de vir a ser o que é, desventrando-se em uma dança-luta-ritual curativa e imemorial. Em sua contínua encarnação, o corpo busca recuperar uma relação que se dá no pré-movimento e no pré-verbal, no sonho ou no sonhar acordado, nos quais trocas emocionais se dão em fluxos intensos de introjeções, projeções e reintrojeções. São histórias fragmentadas e sensações do vivido que conduzem à performatividade da memória autobiográfica da performer Carolyna Aguiar e à recuperação de seus afetos moventes.

´´Sonhar: pode ser algo mágico, mas também é sobre ter pesadelos ou delírios.``

Cássio Vasconcellos
Desde 2008, Vasconcellos desenvolve a série Coletivos, na qual reúne montagens feitas a partir de fotografias aéreas obtidas por ele. Over é um desdobramento dessa série. Tecendo comentários sobre a sociedade de consumo ao tornar visível o impacto da ação humana no mundo, o trabalho reúne imagens provenientes de diversos ferros-velhos do Brasil e do exterior. O artista recorta cada elemento, reunindo-os em uma grande composição. Emerge, então, uma imagem que habita o espaço entre a ficção e a realidade, colocando em discussão o papel documental do meio fotográfico. Over apresenta um cenário que, embora pareça apontar para um futuro distópico, reúne fragmentos do agora. A exagerada aglomeração denuncia como a ideia de descarte pode ser enganadora, tendo em vista que os objetos não deixam de existir quando os jogamos fora, mas passam a habitar outros lugares.

´´Fuga: retirada em desordem e com precipitação de um local.​​​​​​​ Ato ou efeito de fugir.``

Gabriel de la Mora
A poética de Gabriel de la Mora consiste em investigações exaustivas sobre as possibilidades físicas e conceituais dos materiais. Para a construção da obra 29,644 foram utilizadas 383 esferas de vidro soprado, dentro das quais foram inseridos 14.855 fragmentos convexos e 14.789 fragmentos côncavos. O resultado é uma obra que torna indistintas as fronteiras entre desenho, pintura e escultura. Cria-se uma pintura que não é pintura, um espelho estranho, que forma uma dislexia visual. O espectador depara-se com uma sequência de imagens repetidas com algumas diferenças, uma superfície com mosaicos irregulares, mas que mantém um caráter monocromático. Repetição e diferença, diferença e repetição: ainda que a imagem seja a mesma, cada fragmento cria uma imagem única e irreplicável.

´´Trauma: me diga qual a sua visão sobre o que é trauma.``

Lídia Lisboa
A obra Pé de meia é um desdobramento de um trabalho anterior de Lídia Lisboa, intitulado Cicatrizes, no qual uma mulher escreve sua história em um retalho e depois o amarra, o que faz com que ela se cure de miomas e de tristezas acumuladas na sua trajetória. Em Pé de meia, os arranjos de meias-calças, recheadas de meias usadas, também ganham nós e amarrações, mas revelam a necessidade de andar e viajar. Em torno da massa que forma a obra, percebe-se a organicidade das vísceras, pelas quais passam situações da vida. O trabalho lida com processos de cura pela caminhada e o deslocamento.

´´Indecisão se essa obra seria um trauma, sonho ou uma fuga (não realizada).``

Rabih Mroué
Rabih Mroué trabalha com diferentes disciplinas e formatos, passeando entre artes visuais, performance, teatro, literatura, filosofia, teoria política e historiografia. Em suas obras, ele desafia as noções de verdade, de pesquisa e de fatos, criando obras de arte fictícias e transdisciplinares. Mroué pode ser considerado como um pioneiro da palestra-performance – ou “palestra não acadêmica”, como ele prefere chamá-la –, meio escolhido por ele para apresentar sua pesquisa artística. Seu trabalho pode ser entendido como uma forma de “reocupar” os contestados eventos político-históricos da Guerra Civil no Líbano. Ao interrogar a complicada relação entre memória individual e coletiva, revisitando a história oficial, ele combina a ficção artística com uma análise escrupulosa das realidades culturais, sociais e políticas.

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Vivian Caccuri
Por meio de objetos, instalações e performances, as obras de Vivian Caccuri criam situações que desorientam a experiência diária e, por consequência, interrompem significados e narrativas aparentemente tão entranhadas como a própria estrutura cognitiva. A série Fantasma Roupa consiste em uma peça escultórica que deriva da pesquisa da artista sobre os mosquitos e, neste caso em particular, sobre a indumentária usada pelos colonizadores para se proteger das picadas. As esculturas ganham forma na metamorfose entre inseto e humano, criando um elemento interespecífico, um animal translúcido vindo do delírio febril, transformando proteção em exposição.Gilberto Gil (BR), Fausto Fawcett (BR), Wanlov (Ghana) e lançou seu projeto musical Homa em 2016. Seus trabalhos sonoros e composições já foram transmitidas em diversas rádios como Resonance FM (Londres), Kunstradio (Viena) e Mirabilis (Rio de Janeiro). Em Princeton escreveu o livro "O que Faço é Música", investigando os primeiros discos de vinil feitos por artistas plásticos no Brasil, publicado pela 7Letras e vencedor do Prêmio Funarte de Produção Crítica em Música em 2013.

´´Sonho em ser livre, sem traumas e em fuga dos meus predadores como uma bela índigo borboleta azul``
13ª Bienal do MercoSul - Trauma, Sonho e Fuga.
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